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O Livro dos Espíritos  |  Introdução do Estudo da Doutrina Espírita   |  Item V   |  01/02/2002
O PROCESSO DA COMUNICAÇÃO DOS ESPÍRITOS PARTE 2
Estudo 8º.

"A História, que é essencialmente História do Espírito transcorre no tempo... o desenvolvimento do Espírito cai no tempo." 
Heidegger, crítica de Hegel em "O Ser e o Tempo"

Quase um século e meio após Allan Kardec haver codificado o Espiritismo, reina ainda incompreensão a respeito da natureza e finalidade da Doutrina. 
Foi ela, entretanto, elaborada em linguagem clara, precisa. No transcorrer de seu trabalho organizador afirma o Codificador que desejava escrever de modo a não dar margem às ambigüidades, às interpretações ou divergências interpretativas. 
Qual então o motivo que leva espíritas a improvisar ou discordar quanto a questões doutrinárias? No trato com os desencarnados, nas comunicações principalmente, nas manifestações, em sessões mediúnicas, onde a lucidez das certezas? Como a Doutrina Espírita interpreta e lida com o intercâmbio entre encarnados e desencarnados? Entre ler, conhecer, estudar, ouvir dizer, saber e aplicar, onde nos situamos ? 
Por importuna que as vezes essas reflexões possam parecer, faz-se necessário que as façamos para que não permaneça em desconhecimento ou no improviso, a crença que livremente escolhemos. 
Se por ora, só amamos o que conhecemos, imprescindível se faz estudar o processo histórico como possibilitador de, analisando o hoje, face ao caminho percorrido ou a percorrer, nos situemos no agora conscientes do que se espera de cada um, cientes de que... "O Espiritismo será o que dele fizerem os homens"... 
Assim, voltar no tempo...

A - Primeira seita

..1849 - 14 de novembro,... as irmãs Fox (já nossas conhecidas do estudo anterior), levadas por impulso, entusiasmo, juntaram-se para formar uma seita religiosa que não teve muita duração. Deram-lhe o nome de "Espiritualistas" querendo significar que os adeptos acreditavam, aceitavam e tinham o poder de entrar em comunicação com os Espíritos dos mortos. (Ver: item I- Introdução ao Estudo da Doutrina Espírita em "O Livro dos Espíritos ou Estudo 3, e o cuidado de Allan Kardec em designar por Espiritismo ou Doutrina Espírita o trabalho por ele codificado que não só deduziria leis mas também enfatizava conseqüências, itens estes que descaracterizava-o de confusão com esta seita).

B - O significado das mesas 

Segundo os "Espiritualistas", os Espíritos preveniam as pessoas de que estavam se aproximando, através de ruído surdo, como se batessem em objeto ôco ou, mais comum, através do movimento rotativo das mesas, em volta das quais tomavam lugar os crentes e os Espíritos invocados. 
Esse "sinal precursor", o ruído surdo, a mesa a girar, causava profunda impressão na assembléia, que de imediato nomeou uma comissão para averiguar se havia fraude. Ao final das buscas, comunicam que - "parecia não haver enganos" conclusão esta, com restrições e ressalvas impostas pelo fato de que os homens não examinaram as meninas. Novo grupo, agora constituído só de mulheres, submete as jovens a minuciosos exames, não descobrindo existência de qualquer agente mecânico capaz de facilitar ou produzir os aludidos fenômenos. 
A partir daí, a realidade dos Espíritos invocados não mais foi posta em dúvida passando a serem considerados como - "seres perfeitamente materiais embora invisíveis". 
Agora, estamos em 1850. A Sra. Fox e filhas iniciam em Nova Iorque, no Hotel Barnum, sessões públicas. Retornaram a Rochester, viajaram pelos estados do oeste, voltando a Nova Iorque. 
Os "Espiritualistas" cresceram, a seita foi sancionada. No ano seguinte, oitocentos adeptos reuniram-se em encontros para troca de experiências e organização do movimento que delibera e autoriza:

•   reuniões trimestrais
•   fundação de "comunidades harmônicas" ou "círculos espirituais"
•   os grupos deveriam ter número idêntico de adeptos (o que (segundo eles) garantiria o "poder" igual entre todos)
•   a direção tomaria por modelo o corpo humano;

•   o presidente - representando o cérebro
•   vice presidente - representando o nariz e a boca
•   secretários - representando olhos e ouvidos

C - Reunião Coletiva 

Após aprovação das medidas, em meio a intensa exaltação dessas oitocentas mentes reunidas, discursos alucinados, convulsões, berros, gritos, comunicações aconteceram configurando o que se aceita como sendo a primeira reunião coletiva dos tempos modernos em autêntica reunião mediúnica sem controle.
Enfim, o ruído surdo, o rodopio das mesas, provocados em público por Margareth e Kate Fox, foram encarados como fatos positivos, particularmente no que se referia às mesas, sobretudo quando pessoas não associadas à nova religião, obtinham resultados idênticos. 
Num primeiro momento, as mesas eram conhecidas como:-

•   "servum pecus" - expressão pejorativa, traduzida como "mesa ignorante". Só algum tempo depois, é que passará a ser chamada de "mesa que gira" ou "mesa girante"
•   em alemão, receberá o nome de "Tischrücken" e em francês, ..."lá danse des tables".

D - A referência do título em francês justifica-se como a diversão dos salões e os fatos que daí decorrerão, mas por que a referência em alemão ? Qual a importância desse povo no processo ?

A repercussão dos fatos acontecidos principalmente nos Estados Unidos, espalharam-se pelo mundo, como frutos de mais uma seita visionária, absurda superstição, decorridas de práticas misteriosas a que se atribuía presença e intervenção de anjos ou Espíritos, idéia essa que se mantém por mais ou menos quatro anos (1848-1852) referenciando sempre, apanágio de mentes alteradas ou exclusividade de fanáticos. Nesse enfoque, a nova religião, atravessando mares, não encontra abrigo. 
No contexto da Europa, a Alemanha caracterizava-se pelo racional, pelo uso intenso da razão, por sondagens a que se dedicava nas esferas superiores da mente humana. 
Devido a essas características, constituía-se como opinião importante caso desse ou não crédito, aos estranhos contos da seita religiosa da América. Seriam eles capazes de separar verdadeiro do falso, real do imaginário - isso no caso de haver algo. Se invencionices, improvisações, engodos, artimanhas, também provariam com razões precisas lógicas. Ora... 

E - Seqüência nos acontecimentos 

Na América, as "mesas girantes" eram reconhecido meio para comunicação com desencarnados. Não se duvidava esse ponto. 
Um comerciante alemão, estabelecido em Nova Iorque, escreveu a seu irmão em Bremen, em resposta a chistes e pilhérias que este fizera a respeito da "...alucinação americana". 
Em síntese, refletia com o irmão, que os iludidos nem sempre eram os que se apontava e que, para convencer-se de uma veracidade ou não, para contestar com reais argumentos, fizesse experiências, segundo os passos, as instruções que lhe passava, detalhando não só o modo de proceder como também as circunstâncias em que o fenômeno poderia ser produzido. 
O comerciante de Bremen, aceitando o desafio, as admoestações e ponderações contidas, coloca-se em ação obtendo resultados, sucessos que superaram expectativas. Nesse primeiro momento, o fato maravilhoso se espalhou. Como se esperava, porém, experiências desenvolviam-se nas várias partes da Alemanha, por homens cuja honra e reputação científica, colocavam a verdade, a honestidade de suas pesquisas, acima de qualquer dúvida. 
Dr. Andeé, um desses homens e médico m Bremen, foi o primeiro a publicar na "Gazet d'Augsbourg" os resultados obtidos. 
Reproduziremos na íntegra, uma vez que, desconhecido da grande maioria dos espíritas constitui-se como valioso em muitos aspectos, inclusive na avaliação do trabalho dos Espíritos responsáveis. Oferecem eles as circunstâncias, onde o homem chega perto, se aproxima, depara com detalhes, num primeiro momento nem são percebidos. 
Mais adiante, no tempo, é que retomados abrirão caminhos mais claros. 
A transcrição dá idéia de como entendiam, lidavam com o fenômeno, mas sobretudo, permite-nos observar de onde vêm idéias, prevenções, métodos e práticas que hoje não só são encontradas como também recebem ampla aceitação. 
Analisemos: 
"Cerca de trinta pessoas estavam reunidas em uma sala bem iluminada. Uma jovem senhora, irmã do comerciante de Nova Iorque, propôs transportarem a mesa que se achava diante do sofá para o centro da sala. Oito pessoas sentaram-se ao redor desta mesa, que era redonda, feita de mogno, apoiando-se sobre quatro pernas e pesando cerca de trinta quilos. Das oito pessoas sentadas em volta da mesa, três eram homens e cinco, mulheres, variando as idades entre dezesseis e quarenta anos. Entre elas havia um jovem que tinha estudado Filosofia Natural e era tão completamente incrédulo quanto as seis outras. Só a jovem senhora persistia e continuava dizendo:- 
"Muito em breve os que riem estarão do meu lado". Quando todos estavam sentados formaram a corrente. (Como as roupas não devem tocar-se, as cadeiras devem ser colocadas a uma certa distância umas das outras. As pessoas sentadas não devem tocar os pés das outras nem as pernas da mesa. Só se comunicam com a mesa por meio da corrente formada quando cada pessoa coloca as mãos de leve sobre a mesa e toca com os dedos mínimos as mãos dos vizinhos, de modo que o dedo mínimo da mão esquerda do vizinho encoste nos da sua direita). As outras pessoas reunidas em volta da mesa conversavam e riam. 
Após cerca de vinte minutos, uma das Sras. declarou que não ficaria mais na mesa porque estava sentindo vertigens. Levantou-se e quebrou a corrente que, no entanto, foi imediatamente restabelecida. 
A experiência começava a demorar; durava mais de meia hora; alguns já falavam em levantar-se, mas o jovem naturalista exortou o grupo a perseverar e informou que sentia no braço direito uma corrente peculiar que havia passado imperceptivelmente para o braço esquerdo com maior força. Gradualmente os outros disseram que também experimentavam a mesma sensação e tornou-se evidente que o mesmo fluido passara pelas pessoas individualmente e que constituíam cada um dos elos da cadeia. Três delas não eram naturais de Bremen e nunca tinham se visto antes daquela noite. 
Enquanto um senhor idoso tentava provar-me que iríamos ver um novo tipo de loucura em acréscimo às que já se espalhavam pelo mundo, as Sras. sentadas na mesa, proferiam exclamações de surpresa; em seguida, os sete experimentadores gritaram ao mesmo tempo:- "Ela se mexe! Lá vai"!". E realmente era o caso. O topo da mesa começou a mexer primeiro, da direita para esquerda e da esquerda para direita, a oscilar e depois a mesa inteira pôs-se em movimento. Os circunstantes apressaram-se a afastar as cadeiras dos sete experimentadores que continuavam a formar a corrente, enquanto a mesa, que as mãos ainda tocavam levemente, começou a dirigir-se para o norte e a girar sobre si mesma, com tamanha rapidez que eles mal podiam acompanhá-lo nas rotações. O movimento durava já quatro minutos quando um dos espectadores pediu que se tocassem com os braços e roupas, e a mesa parou imediatamente. A corrente foi novamente formada e em cerca de três minutos o movimento da mesa reiniciou-se, com tamanha rapidez que poderia ser comparado a uma corrida comum. As pessoas que formavam a corrente logo sentiram-se cansadas e cessaram o experimento. A mesa, trazida de volta ao seu lugar, diante do sofá, permaneceu na imobilidade normal. 
É evidente que os experimentadores transmitem uns aos outros fluido cuja ação é melhor captada pela pessoa sentada junto a uma outra de natureza sensível. Parece que, para pôr a mesa em movimento, é preciso mais ou menos tempo, conforme a capacidade que têm os que estão sentados em volta dela, de produzir ou transmitir o fluido. 
Em alguns casos, o movimento começa após doze ou catorze minutos; em outros, leva hora e meia ou mais, e às vezes até fracassa. O sucesso é mais certeiro quando a corrente é formada por pessoas de ambos os sexos; as crianças e as pessoas idosas parecem incapazes de produzir a porção necessária de fluido; em alguns casos, no entanto, a experiência foi bem sucedida com meninos de cerca de catorze anos de idade." 
A razão nesse caminhar será escada de que o Homem se servirá para contínua superação dos horizontes anteriores. Funcionará como alavanca que o elevará ao período da transcendência, onde honestamente se conhecerá, delineando assim as perspectivas da própria libertação. 
A soberania da consciência, tão enfatizada por Jesus, chegará com impacto e força assustando num primeiro momento a esse Homem que não percebendo os princípios dessa revolução apega-se aos velhos moldes, subjugado pelos antigos preceitos. 
O Cristianismo em Jesus, redivivo pelo Consolador, dá o maior valor à essa busca, mas convoca a cada um para que busque, viva a ..."fé inabalável que encara a razão face a face em todas as etapas da Humanidade"... 
O tempo, para cada qual é hoje: o momento - agora - porque, segundo Emmanuel... "tudo volta, menos a oportunidade esquecida que será sim, sempre perda real." 


Leda Marques Bighetti 
Fevereiro / 2002
 
Bibliografia:
Allan Kardec - "O Livro dos Espíritos" - Introdução Allan Kardec - 
"O Livro dos Médiuns" - cap. IV - X IV- X - XVI Allan Kardec - 
"Revista Espírita" - outubro 1859 Fevereiro 1861 Arthur C. Doyle -
 "A História do Espiritismo"- V - VIII Francisco Cândido Xavier - Emmanuel - Palavras de Vida Eterna
 
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