Embora o fato seja inevitável, sua
realidade, não só angustia, como apavora grande número de pessoas e tais
impressões até podem ser normais, desde que não se transformem em ansiedade, descontrolando
a ponto de se enquadrar em patologias.
Onde estariam os fatores que
desencadeariam o medo?
Impossível definir o momento, uma vez que
esse sentimento acompanha o homem desde sempre, fazendo parte da estrutura de
preservação; na proporção certa, é-lhe benéfico e necessário. No decorrer dos
tempos, fatores contribuíram para que essa normalidade em equilíbrio fosse
rompida e o temor se instalasse.
Desde a representação mitológica em que a
intenção era realmente causar pânico, ela, a morte, é apresentada como um homem
de faces encovadas, amarelada, olhos fundos e cabelos prateados, manto preto,
trazendo nas mãos a foice, pois sua função era exatamente ceifar vidas.
Na cultura medieval e renascença, as
paredes das igrejas eram cobertas por afrescos com figuras de esqueletos nas
mais diferentes posições; visava lembrar que aquela era a realidade. Os monges,
nas suas longas túnicas negras, cumprimentavam soturnamente: Lembre-se de que
você vai morrer!
Pode até ser que, nesses casos, visassem
preparar as pessoas para a naturalidade das partidas, porque as épocas eram de
terríveis pragas, doenças, epidemias com mortalidade muito alta.
A tudo isso junta-se a ideia de finitude,
despedida, fim, elementos todos contrários à vida, os quais vão juntar-se a
herança social com os rituais da morte, a morbidez dos velórios, o cheiro das
flores em meio a velas, carpideiras, desesperos, desmaios, porque ainda há
detalhes aqui ou ali que, em se somando, constroem ou construíram, em muitas
mentes, um clima de pavor que começa a se fazer presente desde quando a doença
se faça presente.
Some-se a isso que o assunto é intocável;
as famílias, entre si, não conversam a respeito. O máximo que conseguem, caso
algum familiar parta, comentar que ele virou estrelinha... olhe lá no céu....
Está lá.... Não há realidade, serenidade
no tratar de algo natural e normal nos dias do existir ...
É possível não se asilar receio algum?
Dentro de termos normais, algum receio faz
parte da lei de Conservação.
Enquanto o homem não for suficientemente
esclarecido sobre a continuidade da Vida, da Imortalidade com suas condições e
leis, a falta desses subsídios poderia levá-lo a descuidar-se, negligenciar
cuidados que deve à existência que desfruta.
Isso significa que à medida que melhor
compreenda a transcendência, menos apreensão tenha.
Para libertar-se ou atenuar impressões,
uma crença racional é importante, mas só ela bastaria?
Importante seria penetrá-la pelo
pensamento, nos meandros dela, procurando se imaginar o seu corpo privado da
vida, a alma se desprendendo. Enxergar-se, ver-se ao lado, ficar? Partir?
Futuro lhe é perspectiva absoluta?
Detalhes, detalhes, que parecendo tolices
agora, em momentos de higidez, iriam familiarizando o ser com a realidade que
dia mais ou menos chegará.
Desgastar-se dessas impressões marcantes
arquivadas nas fibras estruturais do ser, pede ação; tempo que se condicionará
à proporção em que cada um se entender agora ocupando posição transitória,
porque esse corpo que terá que ser deixado, para adentrar a uma realidade única
e verdadeira – sou um Espírito que usa um corpo-matéria – este terá que ser
deixado, mas eu continuo.
Leda Marques Bighetti – Junho/2024
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