Natal! Á beira da estrada, Na touceira de capim, Maria Joana, cansada, Treme, chora e chega ao fim. Tem sede com febre alta, Dói-lhe o peito exposto ao vento Oitenta anos já somaram seus dias de sofrimento.
Os grupos passam cantando, do mais rico ao mais plebeu: - "Gloria ao Senhor nas Alturas!". Hosanas!... Jesus nasceu!..."
Ninguém para, a fim de vê-la, Todos anseiam chegar, Quanto mais cedo possível, A mesa do próprio lar!...
A pobrezinha relembra A época da saúde, As alegrias do campo, Os sonhos da juventude...
Viúva na mocidade, Vivera escrava ao dever!... Onde os filhos que tivera? Quem poderia saber?...
A quantos patrões servira, De atenção cativa e alerta? A quanta gente ajudara? Só Deus tinha a conta certa
Recorda o arado, a peneira, As plantações da fazenda, O milho para o paiol, A cana para moenda...
Crianças a tiracolo, Serviço de casa cheia, Cozinha laboriosa, Previsão da fome alheia!...
A roupa suja no rio, A enxada que não descansa!... Trabalho!... Apenas trabalho!... O que lhe vai na lembrança!...
Agora que mais precisa colher na leira do bem, Ninguém lhe estende um lençol, Não aparece ninguém!...
A pobre desamparada As vascas da provação, Morre, sozinha e humilhada, sem luma, sem lar, sem pão...
Nisso, um jovem surge a vista, Qual um filho que a buscasse, Afaga-lhe a fonte humilde, Acaricia-lhe a face.
Joana vê-se melhorada, Está contente e forte, A fala volta de novo, Não mais reflete na morte.
- Maria Joana! - esclarece O moço atraente e amigo - Venho buscar-te e saber Se queres servir comigo!...
Ela responde: - Ah, meu filho, Já não sei como viver, estou velha e desprezada, Que posso agora fazer?...
Ele pondera: - Serás Na minha estrada, que é tua, Mãe das crianças jogadas Aos sofrimentos da rua.
Serás a irmã dos que choram, Nas pedras da trilha escura, Aos sopros do desengano, Aos golpes da desventura!...
Serás tutora bendita Dos pobrezinhos ao léu, Obreira da caridade, Na terra como no céu!...
Quem és? - ela indaga aflita, Ao ver-te o manto de luz! Ele diz: - Não me conheces? Sou teu amigo: Jesus!
Joana agarra-se-lhe aos braços, Peito opresso, olhos no além. Ele se inclina, bondoso, E abraça Joana também.
O leito andrajoso e triste, De tanta luz que irradia, Lembra a furna de Belém e a palha da estrebaria!...
Os dois partem sempre juntos Para as estrelas serenas, Num carro todo enfeitado De rosas e de açucenas!...
Milhões de vozes no Espaço - Regozijos no apogeu - Proclamam de canto a canto: _ "Hosanas!... Jesus nasceu!..."
No outro dia, um caminhante Procura acordá-la em vão, Joana morta parecia Dormir tranquila no chão...
O corpo frio, mostrando A paz que o verbo não diz, Era um retrato de Joana Sorrindo calma e feliz!... |