177 – O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO – ALLAN KARDEC

CAPÍTULO XIX: A FÉ QUE TRANSPORTA MONTANHAS

ITENS 6  e  7 - A FÉ RELIGIOSA. CONDIÇÃO DA FÉ INABALÁVEL

Para esse estudo, penso ser útil relembrar o significado da palavra dogma.

No sentido religioso, fideísta, a palavra dogma significa algo que não pode ser contradito, por ser considerada revelação divina. No espiritismo ela tem o sentido filosófico, racional, de princípio, aceito pela razão, como já foi comentado no estudo 31. (1)

Essa é a grande diferença entre as religiões e o espiritismo, doutrina religiosa pelas consequências morais que provoca, ou deveria provocar, em seus adeptos, com princípios racionais, que devem ser aceitos pela razão de cada um, e não como dogma de fé.

Allan Kardec escreve sobre a fé religiosa, que significa a crença nos dogmas particulares das diversas religiões, que têm seus artigos de fé.

A fé religiosa pode ser raciocinada, fruto da razão, ou cega, na aceitação dos seus dogmas como revelação divina.

Assim, a fé cega nada examina, não duvida da sua verdade, mesmo nas idias absurdas, que contrariam a natureza das coisas. Essa fé, quando exacerbada, em determinadas situações, produz o fanatismo. Quando baseada no erro, acaba por desfazer-se.

A fé que se torna firme e sólida é a que tem a verdade, por base, porque então, permanece até com o progresso do conhecimento, “já que o verdadeiro na obscuridade também o é na plena luz.”

Como cada religião se julga na posse exclusiva da verdade, Kardec afirma que “preconizar a fé cega sobre uma questão de crença é confessar a impotência para demonstrar que se está com a razão.”

A fé raciocinada é aquela que vem da compreensão daquilo que se crê. “Para crer não basta ver, é necessário, sobretudo, compreender.” Apoia-se nos fatos, não deixando margem para dúvidas. “Crê-se porque se tem a certeza, e só se está certo quando se compreendeu. Eis porque ela não se dobra: porque só é inabalável a fé que pode enfrentar a razão face a face, em todas as épocas da humanidade”.

 Essa fé estimula o homem a perceber melhor as leis divinas, na sua justiça, na sua sabedoria, na sua necessidade, estimulando-o a perseguir a meta de melhorar-se a cada dia, no caminho da perfeição indicado por Jesus, a fim de tornar-se, um dia, perfeito, como ele determinou no “Sede Perfeitos”, colaborando com a evolução da humanidade terrena, encarnada e desencarnada.

Allan Kardec comenta o dito popular que a fé não se prescreve, o que significa que a fé não pode ser imposta, visto que ela tem de vir como resultado de um trabalho individual, interno, racional.

Assim, a fé nas verdades espirituais é adquirida e desenvolvida por todo aquele que se dispõe a fazê-lo, porque sente em si mesmo que a vida não pode estar circunscrita aos poucos anos que se vive em uma existência na Terra. E quem procura, com sinceridade a encontra e a desenvolve dentro de si.

As pessoas que dizem não conseguir ter fé, apesar do seu desejo, em realidade, não procuram enxergar as provas das verdades espirituais, que estão ao seu redor, procuram uma fé que se adapte à sua maneira de ser.

É o homem que tem de buscar essa fé, com seus raciocínios e sua sensibilidade, que Kardec denominou “maturidade do senso moral” (2), nos fatos da própria natureza, sem preconceitos, com a mente indagadora, aberta a tudo ver, a tudo observar, a tudo analisar para melhor decidir.

Muitas pessoas têm mais facilidade para desenvolver a fé nas verdades espirituais, porque já a trazem de vidas passadas. Outros, ainda têm de fazer esse trabalho interno de auto-educação, no esforço de encontrar as provas de que necessita para tal. Mas, é sempre uma questão de tempo e vontade, porque “Nenhuma ovelha das que o Pai me confiou se perderá”.

O espiritismo veio para auxiliar o progresso moral da humanidade, com princípios baseados em fatos naturais, que levam o homem a adquirir a fé raciocinada, fruto da compreensão desses fatos.

Essa fé leva o homem a sentir-se, realmente, um filho de Deus, com capacidades e possibilidades de desenvolver-se até a perfeição possível, sob a proteção do Pai, de Jesus e dos Espíritos, que já evoluíram mais e trabalham em benefício dos irmãos mais atrasados, na escala evolutiva, mas sempre em progressão constante.

Não mais a fé cega que impede o homem de fazer uso dos seus raciocínios e do seu livre-arbítrio, dados por Deus, mas a fé, fruto do seu esforço em seguir, compreendendo o porquê, o como e o para quê vivenciar cada ensino de Jesus.

(1) Pires, J.Herculano, Agonia da Religiões, cap. III, pág.27, ed. Paidéia, 2ª e. 1984.

(2) O Evangelho segundo o Espiritismo, cap XVII, item 4, 3º§, já citado no estudo 161

                                                        Leda de Almeida Rezende Ebner – Fevereiro/2016